abril 30, 2006

Das pessoas e das Coisas

Embora nem sempre aparente a todos, ou seja, seja visível para um observador médio, o mundo – onde destaco as Janelas, como de costume – divide-se basicamente em uma oposição simples; dicotomia não aleatória de pessoas e coisas. Assim, um tanto não-complexo, mas eu diria que nem tanto!, entretanto se pode imaginar...; pois, é claro, não se explicam as Janelas com maniqueístas um bem e um mal, ou uma lógica tradicional; teoria dos conjuntos e outras ferramentas demasiadas absolutistas.

Difusos têm de ser os conceitos de uma lógica difusa; fuzzy. Existem, portanto e para tanto, níveis intermediários entre pessoas e coisas – embora essa seja a essência toda: há as pessoas-coisas, e talvez as coisas-pessoas, mas não estou bem certo quanto a segunda nomenclatura (pessoas se aproximam das coisas, por excelência; não sei se coisas se aproximam, o que seria por degradação, das pessoas); há as categorias especiais: as palavras-coisas (lembram dos passarinhos-morfemas, coisas palavras da poesia?); coisas-sentidos, sinestésicas; sentimentos-coisas; elephantes, zebras & paçarinhos.

(Difusconceituando: pessoas são aqueles animaizinhos chatos normais inseguros conformados bestamente alegres interesseiros irritantes; aqueles animaizinhos – formiguinhas – que não compreendem as coisas: não compreendem, por exemplo, que uma pedra só não voa porque não quer, e não porque não tem asas – ou que, ao contrário do que pensam, pode-se ver maravilhosamente bem a cor das melodias das vozes das coisas. Coisas são não-pessoas).
As pessoas, em geral, são absurdamente prosaicas; suas ambições são ambições de pessoas prosaicas; seus desejos são desejos de pessoas prosaicas. Pessoas enchem as coisas com conversas de pessoas prosaicas: pessoinhas gostam de falar de outras pessoinhas: o que fizeram, onde fizeram, quando fizeram, como fizeram, com quem fizeram, por que fizeram; pessoas têm desejo compulsivo de fazerem lides de tudo aquilo que as outras pessoinhas fizeram, como se isso fosse a coisa mais interessante do mundo. Como se fosse; como se eu, na minha absoluta condição de coisa, me importasse com pessoas, e ainda outras! Me irrita, profundo, a voz das pessoas.

A voz das pessoas! A voz das pessoas! A voz das pessoas quando elas falam sem parar de outras pessoas, ou de idiotices quaisquer; inutilidades, como é de costume. Somente quando em música (boa) a voz delas não me irrita: quando a voz das pessoas é usada em uma música boa ela se torna uma quase-coisa: a tal da pessoa-coisa, de primeiro nível; uma das mais simples: continua a existir a pessoa, como outra pessoa qualquer, mas esta faz a coisa da melodia; pessoas-coisas são legais, às vezes. Claro que existem, também, cantores extremamente excepcionais que se fossem pessoas seriam como um deus humano, ou alguma coisa assim: portanto, assim posto, são coisas.

As coisas são em geral mais interessantes que as pessoas: prefiro as coisas, de qualquer forma, e até mesmo as couves-flores – que não deixam de serem coisas -, às pessoas; rudes pessoas que gastam o tempo das coisas & as coisas gastam as pessoas para que possamos entender que no fim coisa é coisa – como traço é traço. O tempo gasta pessoas e coisas, embora as pessoas pareçam se preocupar muito com isso; as coisas não têm essas nóias.

Coisas são de essência poética: a própria poesia é feita de coisas e por coisas. Paçarinhos, para citar, são coisas que levam as coisas-palavras passear, viajar, voar; paçarinhos cuidam dos delírios do verbo. As palavras são as coisas mais complexas, porque são elas que mandam, ninguém, nem mesmo as não-pessoas que trabalham os morfemas, ninguém manda nas palavras! São coisíssimas interessantíssimas, as palavras. Pessoas não sabem lidar com as palavras, poderosas coisas.

Pessoinhas são não-coisinhas tão ínfimas que pouco nos importam a não ser pelo medo que temos de ser uma delas; uma formiguinha. As pessoas tendem a complicar as coisas, colocar a culpa nas coisas, criticar as coisas, tudo para esconder sua própria ignorância. Prefiro as lagartixas, as latas de coca-cola vazias e a palavra “pessoa” às pessoas propriamente ditas.

abril 22, 2006

Quando me apresentei, de joelhos, frente
ao altar do meu sacrifício à Poesia, não pude
compreender muito bem a maneira pela qual
soube que nunca poderia entender as palavras,
mesmo que fosse eu quem as colocasse um sentido;
mesmo que fosse eu quem as trabalhasse, arbritário.

As palavras são todas coisasseresviros, seres palavras-vírus,
manipulando a poesia que chamamos ingenuamente de nossa.
Não criamos os versos, não criamos os poemas, não criamos nada:
apenas deixamos livres para voar os morfemas-passarinhos;
apenas acreditamos que a Língua seja o caminho certo a seguir.

E a jovem poeta, frente as suas incertezas, todas,
disse ao jovem poeta: "Eu não tenho mais palavras".
Respondeu o quem-sabe-um-poeta, tentando fugir das
suas próprias não-certezas: "Elas voltam, elas sempre voltam".

Entretanto, a Nós, não-pessoas, não cabe a pretenção
de ter palavras; não cabe a vontade de mandar no verbo.
Não temos palavras, nunca temos palavras. Nunca. Apenas sonhamos.

abril 20, 2006

deus (ou Deus, como preferem alguns) quando criou cá nosso-mundo, terra de vampiros, Adão e Eva – embora à Lilith seja concedida certa mistáurea –, não acerteou a nós quais vestígens sério-levadas sonhoscando resmugaesmolas seriam a parte que nos cabe – pacenosbe. Ventouvidos, algunposta a uma pergunta vertiginosa-vestiginosa, dicotômica. Tento não-esconder: nada esclarece a diferença entre pessoas, coisas, e pessoas-coisas.

Rusgatigens! Pluráforas! Estéticos Estáticos Estádios. Sinestésicas as tolarudes pessoas-coisas (que gastam meu tempo só para que eu possa entender que é o tempo quem me gasta o tempo todo me gastando o tempo). Para nós? Para nós?! Como posso me ter, juntolado, juntado, com mais um milhão – sete bilhões – de pessoas? Prefiro as coisas, de qualquer forma. Efermônicas.

classifico deus e o diabo como interessantíssimas, coisissímas: Deus e o Diabo, uma bela dupla para os meus quiabos, eu diria, mais um dia, imunda satisfação férrea. E às vezes a gente se lembra do quarto dos nossos pais, e do um quarto do nosso país que está fazendo alguma coisa agora (25% me parece uma boa colocação) e como tudo foi Cristo. A vida se apresenlotadecentuações tônicas e históricas.

Só então ouvimozinhos, toc toc toc, batentos no chão do nosso quarto – ou no teto do seu (deles) quarto? Me desgastempo, e é tudo culpa de deus, dolodeus, que no princípio criou o céu e a terra, terréu, serra. Como diz o primeiro versículo do primeiro capítulo do primeiro livro da bíblia que calhou de se chamar gênesis: Criassim o tempo-mundo onde colocou as pessoas, rudes, coisas. Crível.

Versículo segundo maincoerentece – emborafirme, de não-firmes argumentos, que a “narrativa da criação não é um tratado científico, mas um poema que contempla o universo como criatura de Deus” (é o que diz a nota de rodapé da minha bíblia, ao menos).
A terra estava sem forma, disseram os sacerdotes, no tempo do exílio na Babilônia, e as trevas cobriam o abismo e um vento impetuoso soprava sobre as águas. Terra informe me pareceitável, trevas, plausumiveis... mas a água? A água? Veidondedágua?

Certamente se Jó tivessistido, impassível, o alvorecer da criação, poderia nos contalgo, algomais: “O Todo-Poderoso, no princípio, criou o céu, a terra e o mar”; e então seriam contempladas todesferas não biológicas das argumentações da geografia. Geografia que também explicaria o vento, o vento!, caso eu já não soubesse ser esse o próprio deus. Ainda sem as não-respostas, que só voam em vendaval.

Jó, edomita pois sim, porém, não juntesenteve a Jeová no momento “faça-se a luz”, e assim não nos conta nada; Jó Joaquim preocupou-se sempre mais com sua santa mulher. Restas dúvidas, todas, e assim acavidaba: ventogações que eu não desenredo.

abril 17, 2006

O Destino, que por razão das flexões
de gênero da língua que hora escrevo
se apresenta como um ser masculino,
sempre foi e sempre será uma mulher,
como a Morte: uma bela e altiva mulher;
talentosa artesã tecendo os fios
da mortalha negra da humanidade;
compondo os arranjos de flores das
coroas do adeus; criando Desencontros.

E tal Deusa, do Destino e dos Fios da Vida,
disse, incerto dia, desatinos a um poeta:
"Morrerás como os Desgarrados dos portos".
Mas o poeta não acreditava em destinos,
e não conheceu - além de em outras
poesias, de outros poetas - as saudades
dos que ficam eternos, ancorados no cais;
não conheceu o esperar, as confidências,
o gemer infinito da insônia dos mortos.

Agora, poeta em sua tumba de podridão -
sua morada escabrosa -, descansa os olhos.
Há muito tempo foi seu funeral, seu triste
funeral: ninguém chorou ou ficou triste;
nem a poesia, por tanto tempo amada,
derramou um pranto, uma única lágrima.
São vermes quaisquer os que roem sua carne,
não-poetas da decomposição. Vermes,
quaisquer, em seu qualquer deleite fúnebre.

abril 09, 2006

"Escrevi até a exaustão / no pergaminho d'água do sono." (Wally Salomão)

Escrevi até a exaustão,
até a exaustão dos sentimentos
extenuar os meus desejos.
Escrevi à exaustão a exaustão do repetir.
Há, por exemplo, exaustão nos meus olhos, que choram.

Eu me perco nos abismos dos ocenanos,
sonâmbulo e insone eu me perco,
e os pergaminhos também se perdem,
escorrem, líquidos,
para que nada reste escrito em pena & papel.

Os pergaminhos da minha exaustão são pixels pichados
na tela de quatorze polegadas ofuscada do meu computador,
são zeros & uns & uns & zeros ordenados
em pacotes de bits & bytes.

E assim dizem que escrevo, repetidamente,
sempre a mesma seqüencia binária-virtual:
minha imaginação, hiper-moderna,
precisa de memória ram para transcender & voar.

abril 05, 2006

Há, portanto, a me assolar, de tais maneiras, as rusgatigens que, se não-modos, menos ainda, menos, fogem-mo, tropos: metanímias da pluráfora-linguagem: espalhando signos, ícones: sintadigmas para-sintáticos, pára! simetria, pára!, que ninguém quer ter simétricos, sinestésicos, estéticos estáticos estádios: as arcas deslizanlúvios, e nós: noés. Sempre entre; sempragora; antes, de, pois a aproximação há de: movimento-me para as equações: ad-; sempre, porém, adepto, adapto: abequações, abstramentos: autistas e seus afãs. Forja-se então, um universo etéreo: uma névonírica, fina, cobre a floresta negra onde as orquídeas dançam, nuas: isso não satisfaria, nunca, meu apetite por nuvens. Nem mesmo os passarinhos, repetidamente, eles, os paçarinhos, mais voam de cabeça para baixo; mas é talvez porque não sei bem onde fica o chão: cabeças de teóricos, subindo, descendo, aqui, sem espaço. Como imaginar que tanta descompressão se daria pela idéias das frívolas pastoras? Muito me impressionam as impessoais impessoas: as antipessoas – eucoisas – sustentadas por indecenciastas. Às travessias eu me lanço, todo laço feito aço: imunda satisfação férrea: algumas de minhas palavras serão não as palavras, as não-palavras: tenho anseios receosos dos meus receios: calem-se! CALAM-SE!!! Os apitos dos guardas-de-trânsito-florestais são depostos. Ao reinado, agora, aqueles que dantes não puderam falar: Quis Dante que eu, por meus pecados, fosse cair no décimo círculo do ínfero: meu oitavo pecado capital – deturpar o Verbo; destruverbar – levou-me a este capítulo sublimado da Comédia: fui para me tornar um mártir; sou um zeugma. O que me exaspera? Eu te exalto, pois fostes alto e belo; tuas hostes fortes. Mas não mais te espero: expero, expériplo, expeleponeso: Quis, Homero, quis tua Ilíada para minha página pálida, para minha glória quis teu plágio abissal, onde escreverias muito além da superfície: deitaram-me ao Hades: escadarias escancabertas e às bocas. Friíssimo o corte fétido do ferro, meu férrico ferino pai.

abril 04, 2006

I

poesia, passando o tempo em
que (sem saber o quanto querias
gemer ou o que querias dizer
quando me obrigavas, lenta
& subitamente, a fazer um
poema; quando me obrigavas,
mas eu não conseguia, nunca,
parir a tal poesia desejada)
fiz tudo o que me exigias,
pude descobrir que não há
coisas a mais, coisas amenas,
mas há coisas más: coisas doídas.

II

sempre entender que há - em outras
tantas ações - movimentos diversos,
mesmo se, para isso, tivéssemos que
partir a síntese dos versos da poesia
(& tudo então seria permitido); mesmo
se sempre pudéssemos entender porque
se diria: não, direções, adversas rimas.

abril 02, 2006

olho paro o chão do meu quarto:
pára, digo a sujeira,
que já se reproduz:
um sonho qualquer perdido,
e depois já não tenho mais porque
limpar as manchas
de Tristeza que sujam
- quase que eternamente -
o que sobraram das minhas
certezas: os Espinhos.

já não tenho mais:
deixo que às formigas
restem as Pétalas,
pois para mim nada
virá a retornar; descansarei
entre as bagunças que
tentei evitar quando ainda
tinha, de você, motivo
para expulsar as carregadeiras:
deixo ao chão também teu Nome.