julho 30, 2006

praça da espanha (bossa samba rock'n'roll curitibano)

talvez um café expresso
na praça da espanha
expresse a tamanha vontade
que tenho de lhe conhecer

num dia de frio bem frio
o vento é quem manda
dançar pela rua de tarde
até se aquecer


olhando o céu azul
sentando na praça ficar
cantando uma velha canção
sem ver o tempo passar
sem ver o tempo passar
sem ver o tempo passar


talvez um café expresso
na praça da espanha
expresse a tamanha vontade
que tenho de lhe conhecer

num dia de frio bem frio
o vento é quem manda
dançar pela rua deserta
até anoitecer


olhando o céu azul
sentando na praça ficar
cantando uma velha canção
sem ver o tempo passar

e quando um outro café
você quiser vir tomar
ouvindo aquela canção
vamos enfim nos beijar

julho 28, 2006

Canção Desesperada do Errante

A poesia é, por via das dúvidas
uma canção incerta de melodias
improváveis. Te dedico, pois,
incertezas desesperadas. E se o universo
queda de um alcoolismo absorto e violento,
o meu verso se torna um pouco
menos verso quando renego o teu amor
aos poucos. Quando te entrego mazelas.

E eu podia te devolver o que dediquei
às outras donzelas na ausência do
teu reinado, mas de que me adiantariam
os chiados? E em um salão dourado
eu podia te pedir que ficasses. Te dizer
(te mentir) que era meia-noite, que chovia.

Te contar que chorávamos. Que por sofrer
escrevemos nas paredes treslouquices e atravessamos
anti-sutis os fossos revoltosos que cercavam
o palácio. Sabendo que poderia dizer não.
Sabendo sempre que poderia dizer não.

E disseram todos que eu não deveria ter voltado,
quando já por outros motivos
haviam dito que eu não voltaria. Olha-me
bem. Não sentes que o universo roda
como se ébrio tropeçasse em si mesmo?
Um universo em convulsão, como as imagens
daquelas tapeçarias que nunca teci. Não vês? Não sentes?

Quem eram elas? As virgens espumas
que te acompanhavam os cabelos? Quem eram?
Finges não me ver. Tuas mãos carregam flores.
As minhas, sangue. Tua língua carrega mel.
A minha, álcool e fel. O asco que agora te causo.
E me olharias, ao menos, se eu colocasse
fogo no palácio? E eu teria como te pôr fogo
mais um vez? Ou apenas te tirar do torpor
verde do verão com uma ode de incertezas?

Agora, cai pelo infinito a minha canção
desencantada que, nunca cantada, jamais
tocará tua boca. Erro, desesperado, no vazio.

julho 27, 2006

Manual Prático de Sobrevivência Poética I

Não confiar só nas palavras.
Elas são deliciosas mas vis.
Ter cuidado também ao dar confiança
exagerada às manhãs ou às madrugadas
- aos cafés, bentevis e sopas
(dependendo do gosto do poeta).
Confiar vez ou outra
em algum sentido oculto.
E vez ou outra confiar cegamente
nas palavras, que são tudo o que
nos restou do mundo.
Ter cuidado de estuprar poemas alheios
com certa periodicidade e violência lúbrica.
Não ter pudor de copiar poemas alheios
quando se mostrar necessário.
Deixar de escrever crônicas, contos
e matérias jornalísticas
para escrever uma poesia, por menor
que ela pulse. Deixar de escrever um poema
para ler um outro (ou escutar uma música).
Deixar de escutar uma música para dar um beijo,
que é uma outra maneira de escrever um poema.
Às vezes esquecer as palavras pois também
existem os silêncios. Outras, escrever
com disfunção de horário.
Ter uma hora certa para escrever
(como uma manhã de domingo)
se não deixar de escrever em manhãs chuvosas.
Ter uma idéia genial para um poema
enquanto anda na rua.
Não anotar e esquecer, que é mais legal
do que se tivesse escrito.
Ter uma idéia genial para um poema
enquanto toma banho.
Anotá-la no vidro do box com o dedo.
Derreter-se com certas palavras
ditas ou lidas em certos momentos
com precisão ciúrgica de poeta. Cuidar de se
apaixonar por essas palavras em especial.
Trocar correspôndencia (eletrônica, claro)
com alguma poeta muito mais experiente que você
para que ela aponte seus erros óbvios
como a falta de ritmo. E ainda poder ler
a obra poética inétida dela e emprestar muitos
livros da sua prateleira. Depois ouvir que um dia
você poderá, talvez, ser um grande poeta.
Quem sabe? Para isso servem os manuais.

julho 25, 2006

Eu te poeto sóbrio.
Desperdiço-me
em outras palavras
que não as minhas.
Fragmento no tempo
o meu exasperar lúdico
e os relapsos dos meus efeitos.
Supero os relaxos
das nossas narrativas.

Eu te poeto sôfrego.
Despedaço-me
em outros livros
que não os meus.
Pesco pérolas poéticas
em rios que passam
assonantes. E podíamos
enlaçar as mãos agora?
Não podíamos?

Eu te poeto sonâmbulo.
Desfalco-me
em outros delírios
que não os meus.
Poderíamos pluralizar.
Poderíamos poetar. (Se enlaçássemos
as mãos.) Lembras os resvalos
que um dia nos derrubaram felizes
no rio? Inventa-os.

Eu te poeto sádico.
Despudico-me
de dar-te um beijo
quando tu menos esperas.
Soberbo, lúbrico, súbito.
Concateno desejos
sobre desejos para que
alcance a poesia e
um dia me descubra ar.

Eu te poeto sarcástico.
Desenvergonho-me
como bem sei que gostarias.
Numa tempestade
quando pudermos nos molhar
e sutilmente os ângulos
nos mostrarem que somos
tortos. Eu te poeto sinestético.
Órfico, erótico, sônico.

Eu te poeto, poeta, somático.

julho 23, 2006

I

E que se explodam os singulares,
o que me importaria? Se eu tivesse
de alguma forma marés de palavras
e me invertesse em inamovível
perante a Lua, seria, antes,
uma lavra de desejos a ser consumida.
E o que me importaria se nos
perdêssemos e nos achássemos anos depois,
sôfregos de abraços, se de uma
maneira ou de outra, por um descaminho
inelutável, nos encontraríamos?
Seria doce, como seria, vestir-te de mim.

II

Há uma coisa de instrumental
em certas cercanias que me cobram.
Se te acredito perdida, é por
não tocares este sino que passas as tardes
olhando. Ou porque insistes em dizer
que vais partir, quando sei
que giras ao redor desta galáxia que criaste
para acampar nua e sem palavra nenhuma
deixas bem claro que não dará, nunca,
um passo sequer que te separe
dela. Porque então tentas me enganar?
Ou me pedes que sentado e casto
espere a tua abocanhada fria? Bem sabes
que o frio tem mais influências
sobre nossas marés do que a lua
e que a estrada que persegues é deserta.
Vazia como uma poesia de amor
escrita para nenhuma das musas amadas.
Como se explica esse teu absolutismo?

julho 21, 2006

Ventogações à Poesia

I

Só poderia desistir da poesia
- embora não acredite muito em poemas -
se depois de ler "O poeta inventa viagem,
retorno e morre de saudade"
eu comesse um punhado de cerejas
vermelhas e petit gateaus com sorvetes
de flocos e aí fosse dançar na chuva.

De outra forma, continuaria escrevendo.

II

Quando eu comecei a escrever
por causa de um poema do solda
que dizia "me entupi guarani"
(seria de cerejas?)
eu só queria mostar
como podia muito bem fazer aquilo.
Agora já me perco da simplicidade
de outros versos que um dia fiz.

Como seria tudo isso
(ou pelo menos a minha poesia)
se eu não tivesse descoberto
uma coisa chamada pós-modernismo?

III

Um dia eu escrevi um troço que
não fazia muito sentido
e por isso afirmei ser uma poesia.
Mostrei para minha professora
de português, e ela disse que
aquilo se chamava "concretismo".
Eu tinha 15 anos, foi meu primeiro
poema concreto sem saber o que
raios era o concretismo.
Não lembro muito bem dele.
Acho que era colorido e
tinha o formato da bandeira do brasil.
E todas as palavras acabavam com "mente".

Os irmãos campos que me perdoem
mas eu inventei o concretismo
no primeiro ano do ensino médio.

IV

Quando estudei as vanguardas européias
no terceiro ano do ensino médio
foi que comecei a gostar de coisas
supostamente sem sentido.
Daquela tempo data um movimento poético
chamado "pós neo futurismo"
do qual eu fui o único adepto.
Produzi pelo movimento dois manifestos
que se perderam nos anos.

Naquela época eu ainda não sabia
que o marinetti era fascista
e me dizia anarquista. Talvez pela
última meus poemas não eram tão sem
sentido quanto eu gostaria, ou quanto
são agora, que não tenho mais ideologias
para expor nos meus textos,
porque eu fazia isso, escrevia sobre liberdade,
diferente de outros poetas anarquistas
que, felizmente, escrevem sobre o amor.

Eu sempre acabo me lembrando do tzara
("sou a princípio contra os manifestos
assim como sou contra os princípios")
e sorrindo.

V

Eu acho que a poesia não é feita de poemas geniais
mas sim de versos absolutamente perfeitos.
Existem alguns poucos poemas completamente perfeitos
que devem ser lidos e relidos à exaustão
(como disse nelson: "há uns poucos livros totais...")
mas existem versos que valem por livros de poesia inteiros.
Eu tento, absurdamente em vão, compô-los.
Escrever um verso perfeito deve ser como ter um orgasmo eterno.


VI

Sempre recorrem à idade
da primeira publicação
ou à quantidade de livros publicados
para me provocar.
Há um escritor de 31 anos
que já publicou 8 livros
que tem sido uma imagem freqüente
nas provocações que uma
amiga poeta gosta de me fazer.
Ele tem um gato chamado kafka
e um romance que estou lendo e gostando.

Quando eu tiver 31 anos
e um cachorro chamado vila-matas
espero já ter publicado
ao menos um livro
do qual eu não goste.

VII

Fui muito feliz no dia
em que uma grande amiga me disse
que nunca havia dado muita bola
para a poesia, até me conhecer.

Me senti pela primeira vez
fazendo um bem à Literatura.
Ela, de qualquer forma,
fez um bem danado à minha.

VIII

Agora o que nos resta
é ler toda a obra reeditada da hilda hilst
que tem capas lindas
apesar de não ser da cosacnaify.
Ler tudo e constatar que a gente não escreve tão bem.

Então tomar vinho até ficar bem bêbado
e desencanar, roubar uma placa,
decorar a casa e comer um cachorro-quente na esquina.
Como se fôssemos pessoas normais,
e não as coisas que somos.

Eu, como não tenho muito ritmo, jogo as palavras
de qualquer jeito no bloco de notas,
e exatamente por não usar o word, cometo alguns
erros ortográficos que a regininha
se encarrega de corrigir.

Além de tudo, o word não entende neologismos
e sempre marca "ventogações" de vermelho
como se a palavra não existisse.
É claro que existe, e um dia ainda vou
desenredar todas elas, divinas ou não.
Posso deitar sobre teus olhos
um sorriso gostoso como
estalos de cereja. Ou posso
te conduzir aos prados, aos campos
das roxas borboletas.

Posso tocar tua face
de leve, assim como
se não tocasse, mas tocando,
névoa. Ou posso te derreter.

E se de repente uma taça
de vinho tinto me lembrar você?
(E você me lembrar o gosto do vinho?)

Assim, de repente, eu tocaria
com meus olhos teus lábios.

julho 19, 2006

auto retrato I

eu não tinha mais motivos para acreditar na poesia
nem no google
nem na wikipedia
e nem sociólogos e filósofos com nomes de difícil
pronúncia para o meu tupiniquin rasgado
podia ler lyotard e tentar descobrir
ao final de todas as contas
se ele é a favor ou não da pós-modernidade
ou eu podia ficar sentado olhando para a tela do computador
meio embaçada
ouvindo libertines
que foi o que eu fiz
porque o dia mais feliz da minha vida
foi quando descobri que eu nunca seria arthur rimbaud
de desbunde resolvi ser todos os outros
e ainda copiar imagens do francesinho como bem me coubesse
só gostaria de saber se lyotard
também francês
defenderia ou não minha decisão
porque ainda não consegui descobrir se ele gosta ou não
embora a wikipedia tenha me dito que ele gosta
e o ítalo moriconi tenha me dito que não
e o ezra pound tenha me dito que para ser poeta
tem que tocar cítara e falar grego antigo
não faço nenhum dos dois e não pretendo aprender
mas ele gostava do cummings
e eu também gosto do cummings
e os irmãos campos também gostavam do cummings
e o cummings não sabia nenhum dos dois
acho
mas sabia pintar
e o que eu sei é mexer no computador e tocar baixo
fico ouvindo libertines e querendo ter uma banda de rock
que se chame pós
e uma que se chame memes
que já existe, mas não ensaia
e quanto menos motivos tenho para acreditar na poesia
mais escrevo
que quanto mais inútil ela me parecer
mais vou escrever
essa coisa que me sai assim
talvez por todos os livros que ainda não li
que eu tentava ler joyce
mas o gabo disse que quando leu joyce aos vinte anos foi inútil
eu tenho dezenove
e leio lytoard a duras penas
mas escuto bastante música, se isso servir de agum consolo
li pouco de drummond mas digo que é o maior poeta brasileiro
o poeta brasileiro que mais li é paulo leminski
e embora meu texto não pareça muito com o dele
também escrevo porque é preciso
e meu sonho é escrever um poema como iceberg
uma prática pálida, três versos de gelo
ou como rose rilke raimundo corrêa
se é que o nome era esse
que falava das pálpebras
imagem que também já copiei em algum texto por aí
depois que resolvi que copiar era a melhor solução
e ainda dizer que é meu
era isso ou ficar parando enquanto toca libertines
ou dançar sozinho
danço e escrevo
e às vezes tenho que consultar a wikipedia
ou procurar alguma coisa no google
mas são recaídas que também tenho aos caras dos nomes
que não consigo dizer
e à poesia, ao pó da heresia
quase até que diariamente
e me parece natural não saber bem se falei ou não das coisas

valsinha

pegas
no tempo
o tempo
da valsa
da valsa
que cantas
num tempo
feliz
e como
seria
o poema
da valsa?
seria
cantado
um poema
feliz?
seria
talvez
um poema
dançado?
um
dois três
um
dois três
sorria
o poeta
e sua bela
poeta
a girar
a girar
a girar
a girar
no tempo
da valsa
no tempo
da valsa
canta
o poeta
os versos
da dança
e tem
sua dama
dançando
a rodar
na valsa
o tempo
sorrindo
feliz

valsa de uma cidade (recém-escrita)

a cidade perdida
muito cidade
muito perdida
com suas paredes altas
suas travessas estreitas
e a gente pela rua
muito a gente
muito perdidos
improvisando
alguns passos de dança
de um samba de gafieira
um tango ou um twist
enquanto os pinheiros
das calçadas
empoçam com a água
da chuva de sempre
aquela chuva
muito da cidade
muito da gente

julho 16, 2006

e eu bati na retrocedência
a confusão
pois sem saídas me coloquei rasgado
entre as paredes
e placas de proibido fumar
que você atirou em mim
tão tranqüilamente
feito um fósforo apagado
na pele desafinada
dos meus desencantos de poeta
sem campos harmônicos
que em cantos improváveis da sala de música
quando rebater os ritmos
fez reverberarem as retrocadências
confusão pela confusão simplesmente
convulsão poética
da mentira decadente
não poderia terminar tudo sem te dizer
não
não escute
a lua
no céu azul às três horas da tarde
enquanto tomas café gelado
não escute
as ardências dos machucados sangrando
e querendo dormir
derreta ligações mas não escute
o bate bate da minha indecência
para manter juntas
as palavras as mp3s e os pedaços de pizza
em um liquidificador com coca-cola

julho 15, 2006

ESCREVER É UM ATO INSENSATO. A frase batia forte nos seus olhos enquanto a escrevia no bloco de anotações, comprado anos antes para a confecção do primeiro romance e até hoje em branco; em letras grandes, de forma, todas do mesmo tamanho, um pouco garranchadas, compôs a máxima – primeira linha escrita de algum outro romance fantasma. Por outro lado, na sua cabeça fervilhante, sem espaço para branco algum, o que pulsava era a palavra “diluído”, que ela havia lhe dito dias antes. E “diluído”, que sempre o remetera à imagens desagradáveis, era agora pior.
Sempre se achou um ridículo por sentir uma vontade irreprimível de escrever sem-sentidinices; mas daí a ser um fracassado, foi um longo salto. Um longo salto. Falar, falar, e não dizer nada; bendita poesia. O que cabia à ela se não a inverdade? Nunca duvidou da questão. Mas sempre achou inútil escrever para mostrar aos outros; por isso anotou embaixo: solitário; e depois: maldito. A poesia é, por via das dúvidas, uma canção incerta. Eu te dedico, pois, incertezas.
E como pulamos de “diluído” para “ridículo”? Só se explica por uma certa aproximação sonora, uma rima falsa – bem, bem, bem falsa; é preciso imaginação para enxergar tal rima. Talvez seja até por isso que considerou escrever algo insensato, pois nos levando a tais desvarios como o da aproximação fonética entre “diluído” e “ridículo”, nada deve ter de parentesco com aquilo que chamam de sensatez. Ah, a insensatez.
E atou ao ato o incenso (ou o incesto?) do ato; desmontando palavras – essa coisa de querer ser exatamente aquilo que a gente é. Ateu, rezou duas ave-marias por cuidado de talvez estar errado. Fez o sinal da cruz e entregou a carta nas mãos dela. Acontece que depois da coisa dita, “escrever é um ato insensato, solitário, maldito”, nada mais fazia muito sentido; como era de costume nos textos de outros tempos. Gostava de repetir: “e como me surgissem melodias improváveis, resolvi me fazer poeta”. Mas o que realmente sobrou de troféu, foi a confusão. E nada mais que ela.

julho 06, 2006

Um vasto pedaço de tango sobre nada. Um vago estilhaço. Tudo é introduzido para que os passos sejam flutuantes e depositados ao acaso. Por causa deles, arranho inocuidades enquanto persigo, imóvel, uma sombra; e se toco a sinapse das flores, é só por acaso e isso me leva a outra sombra, e a outra, e a outra... Enfim, dezenas de sombras sobre sombras tentando me fazer alguma coisa a mais que pálpebras. Eu não queria mais ser uma sombra de uma sombra – nem tornar-me invisível. Queria poder refazer os verbos, ou simplesmente masturbá-los; ou simplesmente, enquanto dançamos como se fosse um embate final.

Algumas pérolas deliciosas são necessárias para a vida. Só preciso de uma causa – uma faca – que me ajude a abrir a concha das palavras, que engoliu a madrugada. Palpitam-me álogos dos mais diversos tipos. Três chances dos tempos giratórios, dentro das condições pós, as cavidades. E em que lugar da sala deixará meu parecer-se com? Doces cones periféricos aos becos. Por causa deles, brusco, parti ao outro lado. E que prazer me daria se deixasse eu ser simplesmente trinta e dois; ou cento e cinqüenta. E minha poesia fosse feita muito de copiar e transcrever.

Se ali se falasse em Maravilhas, saberia que as prefiro às Sempre-Vivas, mas nunca às Gravanhas ou às Begônias. E esta recorrência às imagens de outrora é obviamente pela minha falta de imaginação. Hoje, noite, só consigo pensar em poemas de um único verso. Deixo os pontos nas ruas escuras. Retificada a derrota, perco-me. Pula a pulga como se estivesse com pulga nas calças. Bandido, roubo-te tremores. Farejo no ar burlescos assobios não permitidos. Como se pulsassem no desejo as borboletas da carne. Hei de, calado, suar palavrões. Um vasto pedaço de tango sobre nada.

julho 04, 2006

ainda vamos para buenos aires!

uma flor gigante
metálica
que não precisasse
de maneira alguma
ser reinventada
uma flor de pétalas brilhantes
que se abrisse durante o dia
& à noite fechasse

uma flor que tivesse
no enquadramento
no canto inferior direito
alguém esperando um poema

julho 02, 2006

De volta aos "Delírios Não-Tropicais da futura geração de escritores do brasil"

"E como as casas me habitassem, esperei; do alto, esperei." (Uh)

E como se eu habitasse o tempo, impublicável – absurdo! – tomei a liberdade de criar novos móveis; novos pregos; novas pressas, presságios. Depois, sintomáticos, nos unimos ao mato – ativos, cativos, contemplativos; mato. Pois eu, eu tenho muito mais escadas – boa tarde a todas as pessoas aí de baixo! Escalas pentatônicas em pautas invertidas. E como se eu tivesse letras, poucas, e papéis, milhares, restou uma poesia repetida das formas diversas que me foram possíveis; repetida à exaustão. Nas linhas havia eu (eu) aqui (aqui); mas nunca disse do que fui agora.

Uma tarde vazia é muito mais triste do que dálias pisoteadas. Havia um sapo que comia minhas auroras (comi-o feito rã; por isso ganhei certa agilidade na hora de caçar moscas). As auroras nunca mais foram minhas. Deu-se a lógica (divina) em partes quebradas nos muros – nas muretas com cacos de vidro. Sou um mentiroso odiado pela lua; e mentirosos, por sua vez, são cemitérios abandonados. A lua é cruel – mas dizes que não há perigo em brincarmos lá; o sol é amargo e queima. As nuvens noturnas – soturnas – nos observam, todos, e fazem o julgamento: culpado, culpado, culpado! Confesso: muito de mim eu inventei; minto poesias por não existirem pastos (peça desculpas!).

E, assim mesmo, os pássaros nos devoram enquanto cantamos – o pássaro é reto, torto é o ângulo – e nos atacam com algumas das palavras mais bonitas que conhecemos. Porquanto não há explicações. As regras da minha poesia são minhas (só não penso que as auroras também eram). As regras da minha poesia são auto-suicidáveis. E como se eu habitasse postes, tomei a liberdade de chutá-los, para ver se apagavam – ou se apagavam as palavras no papel branco (todos aqueles que não foram preenchidos pela pouca poesia; as páginas gritavam, pálidas de tanto). Meros plágios, mais uma vez. Confesso: muito de mim eu copiei.
tenho sabão no cabelo. por um momento,
um breve momento, isso me incomoda. depois esqueço.
há coisas melhores para se pensar, outras idéias, outras imagens
como caminhar na praia. como escrever uma poesia. como um beijo.
me observo:
estou sem camisa, está frio e me sinto gordo.
por um breve momento isso me incomoda.
depois passa. depois penso em outras pessoas, coisas
em outros sonhos. e se serei capaz.
penso em outros olhos, bem mais claros que os meus
e por um momento tenho a vista embaçada, mas isso não me incomoda.
também não me incomodaria se por um momento, mesmo breve
eu fosse a poesia.
definitivamente não me incomodaria.
tenho fome. e isso vai me incomodar até que eu coma.
e há mais: vontade de ganhar um abraço, vontade de andar de moto
vontade de gritar, de tocar guitarra
de escrever uma poesia épica
um poema piada
dois hai-kais e meia dúzia de poemas normais.
tenho bolhas de sabão no cabelo, sabonete nas sombrancelhas
e vinho no chão do meu quarto.
havia poesia nas minhas mãos, mas eu deixei cair pela janela do terceiro andar.