julho 21, 2006

Ventogações à Poesia

I

Só poderia desistir da poesia
- embora não acredite muito em poemas -
se depois de ler "O poeta inventa viagem,
retorno e morre de saudade"
eu comesse um punhado de cerejas
vermelhas e petit gateaus com sorvetes
de flocos e aí fosse dançar na chuva.

De outra forma, continuaria escrevendo.

II

Quando eu comecei a escrever
por causa de um poema do solda
que dizia "me entupi guarani"
(seria de cerejas?)
eu só queria mostar
como podia muito bem fazer aquilo.
Agora já me perco da simplicidade
de outros versos que um dia fiz.

Como seria tudo isso
(ou pelo menos a minha poesia)
se eu não tivesse descoberto
uma coisa chamada pós-modernismo?

III

Um dia eu escrevi um troço que
não fazia muito sentido
e por isso afirmei ser uma poesia.
Mostrei para minha professora
de português, e ela disse que
aquilo se chamava "concretismo".
Eu tinha 15 anos, foi meu primeiro
poema concreto sem saber o que
raios era o concretismo.
Não lembro muito bem dele.
Acho que era colorido e
tinha o formato da bandeira do brasil.
E todas as palavras acabavam com "mente".

Os irmãos campos que me perdoem
mas eu inventei o concretismo
no primeiro ano do ensino médio.

IV

Quando estudei as vanguardas européias
no terceiro ano do ensino médio
foi que comecei a gostar de coisas
supostamente sem sentido.
Daquela tempo data um movimento poético
chamado "pós neo futurismo"
do qual eu fui o único adepto.
Produzi pelo movimento dois manifestos
que se perderam nos anos.

Naquela época eu ainda não sabia
que o marinetti era fascista
e me dizia anarquista. Talvez pela
última meus poemas não eram tão sem
sentido quanto eu gostaria, ou quanto
são agora, que não tenho mais ideologias
para expor nos meus textos,
porque eu fazia isso, escrevia sobre liberdade,
diferente de outros poetas anarquistas
que, felizmente, escrevem sobre o amor.

Eu sempre acabo me lembrando do tzara
("sou a princípio contra os manifestos
assim como sou contra os princípios")
e sorrindo.

V

Eu acho que a poesia não é feita de poemas geniais
mas sim de versos absolutamente perfeitos.
Existem alguns poucos poemas completamente perfeitos
que devem ser lidos e relidos à exaustão
(como disse nelson: "há uns poucos livros totais...")
mas existem versos que valem por livros de poesia inteiros.
Eu tento, absurdamente em vão, compô-los.
Escrever um verso perfeito deve ser como ter um orgasmo eterno.


VI

Sempre recorrem à idade
da primeira publicação
ou à quantidade de livros publicados
para me provocar.
Há um escritor de 31 anos
que já publicou 8 livros
que tem sido uma imagem freqüente
nas provocações que uma
amiga poeta gosta de me fazer.
Ele tem um gato chamado kafka
e um romance que estou lendo e gostando.

Quando eu tiver 31 anos
e um cachorro chamado vila-matas
espero já ter publicado
ao menos um livro
do qual eu não goste.

VII

Fui muito feliz no dia
em que uma grande amiga me disse
que nunca havia dado muita bola
para a poesia, até me conhecer.

Me senti pela primeira vez
fazendo um bem à Literatura.
Ela, de qualquer forma,
fez um bem danado à minha.

VIII

Agora o que nos resta
é ler toda a obra reeditada da hilda hilst
que tem capas lindas
apesar de não ser da cosacnaify.
Ler tudo e constatar que a gente não escreve tão bem.

Então tomar vinho até ficar bem bêbado
e desencanar, roubar uma placa,
decorar a casa e comer um cachorro-quente na esquina.
Como se fôssemos pessoas normais,
e não as coisas que somos.

Eu, como não tenho muito ritmo, jogo as palavras
de qualquer jeito no bloco de notas,
e exatamente por não usar o word, cometo alguns
erros ortográficos que a regininha
se encarrega de corrigir.

Além de tudo, o word não entende neologismos
e sempre marca "ventogações" de vermelho
como se a palavra não existisse.
É claro que existe, e um dia ainda vou
desenredar todas elas, divinas ou não.

2 comentários:

Anônimo disse...

mal posso concatenar todas as idéias.

Cauê disse...

"Os irmãos campos que me perdoem
mas eu inventei o concretismo
no primeiro ano do ensino médio."

só poderia vir de você: ególatra..