junho 26, 2006

Não-Crônica do Dia dos Namorados (para a primeira aula da Oficina de Crônicas da Regininha)

E se pôs de lado, como de costume nos últimos tempos, com os braços enlaçados ao corpo dela. Ele não tinha mais problemas com a situação do pós-sexo, gostava até – um tolo romântico disfarçado pela fantasia devassa de 20 e poucos anos e 16 segundos atrás. Quem diria do cafajeste de sempre – o cafajeste de todas as histórias anteriores – “gosta de ficar abraçadinho depois de gozar”? Nada menos natural. Mas é claro que existem situações, situações e situações. Há momentos – contextos, mulheres – em que o velho clichê de virar para o lado – o outro lado – e acender um cigarro não é tão importante quanto fumar um cigarro – o mesmo cigarro – com ela.

Naquele dia, entretanto, ela é que se desvencilhou do abraço e pegou – não o cigarro, que estava atrasada – mas a calcinha e o resto de suas roupas – acenderia o vício, claro, no caminho. Ele estranha a recusa ao romantismo e se sente estúpido por ter se oferecido à vergonha. Que venha a pós, a hiper, a super, os novos séculos da modernidade – já se disse que as mulheres gostam de certos romantismos. De certas coisas, aspectos – embora, de certo, se verifique, às vezes, o inverso. Mas não era o caso. Ou melhor, era o caso. O namorado a esperava para jantar.

O quarto semi-escuro, ela se vestindo. Nelson Rodrigues já havia dito que às vezes, em uma traição, o homem prefere ser o traído, e não o amante. O sentimentóide absurdo daquele instante – pelado, fumando um cigarro apagado e buscando um abraço invisível – não se repetiria pela namorada, caso ela existisse nesse dia dos – o que seria a namorada? Sempre foi só sexo, o namorado a esperava para as outras coisas – flores e declarações de amor à contragosto. Há homens que acreditam que a depravação, de alguma forma, sublimaria a sua existência romântica. Há os que o guardam, o romantismo, para si, duvidando – ou não querendo que – que ele possa existir. Há os que exageram.

Uma compensação de sentimentos – não só de sexo. Um sensação. Quando a porta se fecha , com os passos dela – decididos – descendo a escada, é estranho. Sabe que ainda é cedo, que há putarias por vir – orgias devassas -, que o maldito dia dos namorados é estúpido e sentimentalismo exagerados são estúpidos e essas idéias são estúpidas. Sabe que vai fazer sexo ainda hoje, mas que vai virar para o lado – o outro – e fumar o cigarro – o sozinho. E sabe que se tentarem abraça-lo vai ficar puto e sair da cama, pelado, fumando o cigarro – aceso – e deixando à garota um abraço invisível. Há qualquer coisa de ilógica nos clichês.

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