setembro 11, 2008

Mariana estava muito bonita naquela tarde, mais do que o costume para uma tarde qualquer de primavera em que não vestia nada de especial somada a cabelos bagunçados. Também estava de ressaca. Sabia que era impossível ficar em casa de ressaca em um domingo com dois irmãos mais novos hiperativos gritando e brigando cada pequena fração do dia, então aceitou o convite de Renan para tomar sorvete (cerveja). Mariana não se lembrava de metade do que tinha feito na noite anterior, mas sabia que não fora exatamente por causa de Helena que tinha bebido tanto, embora tenha sido por causa de Helena – não do jeito que Helena imaginaria que foi se soubesse (se é que já não sabia) que Mariana bebera tanto. Mariana sabia: Helena achava que ela queria voltar a ter um romance com ela, quando só o que ela queria era transar. Não era mais aquela Mariana de 17 anos presa em uma bolha do tempo que faria tudo para dormir abraçada com ela e falar que a amava. Depois que Helena foi embora para a Europa, Mariana nunca pensou realmente em como seria o retorno. Quer dizer, no começo sim, nos primeiros dias, mas então começaram as aulas da faculdade e entre as pessoas da sua turma ela encontrou U. Por alguns meses Mariana achou que estava apaixonada por U, até mesmo chegou perto de se declarar. Elas faziam sexo, às vezes, mas Mariana, embora já não pensasse em Helena, sentia falta daquela segurança. U não podia lhe dar isso, e ela também logo deixou de querer. Imersa em um novo universo, absorveu tendências e conceitos até que se aproximou tanto da personalidade hedonista de U que U passou a se parecer um pouco com Mariana. Helena, porém, agora que voltou, enxerga Mariana presa na bolha de 2003, junto com a Invasão do Iraque, o segundo álbum do Strokes e a novela Mulheres Apaixonadas. Ela soube, claro, que U, sua grande amiga de infância, estava estudando com Mariana, sua grande amiga da adolescência, mas nunca, antes de voltar, pôde entender o que surgiria desse encontro. E ainda não entendeu. U é que, nessa situação, pôde se deliciar com as histórias que Mariana contava sobre Helena. O primeiro beijo que U deu em uma garota foi nela, quando tinham doze anos. Helena se sentiu muito mal na época, e pelos próximos dois anos que estudaram juntas U guardou para si a inveja que sentia dos meninos que ficavam com sua amiga. E então, quando nem pensava mais nisso, encontrou Mariana, e descobriu tudo o que Helena fez nos três anos em que não se viram e como a lembrança daquele beijo infante marcara com uma idéia de carinhos perdidos a adolescência lésbica dela. Foi aí que U pensou realmente no retorno de Helena. Não da forma como Helena imaginava que Mariana pensaria, mas da forma como Mariana imaginaria se ela mesma pensasse sobre o assunto. E ela até pensa, naquela tarde de primavera em que está linda, com os cabelos pretos despenteados e uma camiseta colorida qualquer, em como seria prazeroso transar com Helena se ela não enxergasse tudo preso lá atrás, com o primeiro disco do Darkness e a primeira temporada de The O.C.

setembro 10, 2008

o concreto transforma
em concreto a viga invisível
que sustenta o céu e
agarra a tua coxa com dedos feito dedos tarados
te arranha inteira
e você até gosta

setembro 04, 2008

À noite, quando ventava muito, Helena e Mariana se abraçavam mais.